Sociedades de advogados – natureza e regime

Atualizado em 2023/08/01

1) Definição de sociedade de Advogados:

A sociedade de advogados é uma entidade (pessoa coletiva):
i) criada necessariamente por dois ou mais sujeitos de Direito (sócios) que, via de regra, são Advogados,
ii) dotada de personalidade jurídica (é um sujeito de Direito de tipo pessoa coletiva, autónomo face aos sujeitos dos respetivos sócios, com aptidão para ser titular, em nome próprio, de direitos e obrigações),
iii) sendo, por isso, também dotada de autonomia patrimonial e
iv) (dotada) de órgãos próprios com aptidão para exprimir uma vontade que lhe é juridicamente imputável, que a representam para todos os efeitos e cujos atos praticados nessa qualidade, lícitos ou ilícitos, a vinculam,
v) destinada ao exercício em comum e em exclusivo da Advocacia,
vi) com o objetivo de obter lucros e distribui-los pelos sócios, ficando estes, todavia, sujeitos a perdas [1]No sentido de que a sujeição a perdas por parte dos sócios é um elemento essencial do conceito de sociedade, J. M. Coutinho de Abreu, Curso De Direito Comercial – Das Sociedades, Volume … Continuar a ler, e
vii) que está sujeita ao poder disciplinar da Ordem dos Advogados.


2) Características:

Por ordem gradual de especificação, as sociedades de advogados são:
i) sujeitos de Direito, dotados de personalidade jurídica,
ii) pessoas coletivas,
iii) pessoas coletivas de Direito Privado,
iv) sociedades,
v) sociedades civis, concretamente sociedades civis sob forma civil especiais (ver: sociedades civis sob forma civil),
vi) sociedades de profissionais, e
vii) sociedades de profissionais sujeitas a associações públicas profissionais.

3) São sociedades civis sob forma civil especiais:

Há algumas espécies de sociedades civis, concretamente, que integram a categoria das sociedades de profissionais, que não têm liberdade para optar entre a forma comercial e a forma civil. É o caso:
– das sociedades de advogados,
– das sociedades de notários; e
– das sociedades profissionais de solicitadores e de agentes de execução.

Com efeito, nos termos dos Estatutos de cada uma das respetivas Ordens, estas sociedades não podem adotar a forma comercial, mas sim apenas um de dois tipos (civis) especiais, devendo a firma conter a menção ao regime adotado:
          a) sociedades de responsabilidade ilimitada, RI;
          b) sociedades de responsabilidade limitada, RL.

Cfr. quanto às sociedades de advogados o art. 213.º, n.º 10 do Estatuto da Ordem dos Advogados, constante da Lei n.º 145/2015, de 9 de setembro, com as alterações subsequentes [2]Consultar o Estatuto da Ordem dos Advogados no link: https://www.pgdlisboa.pt/leis/lei_mostra_articulado.php?nid=2440&tabela=leis&so_miolo=.

4) Sociedades de profissionais:

Dentro da categoria das sociedades civis (com objeto civil – não comercial), existem as sociedades de profissionais, que são uma subespécie muito importante das sociedades civis.

As sociedades de profissionais são as pessoas coletivas (sociedades):
– que têm por objeto principal o exercício em comum de atividades profissionais organizadas numa única associação pública profissional (“Ordens” ou “Câmaras”); e,
– onde a formação do lucro é feita depender exclusivamente ou quase exclusivamente das atividades dos respetivos sócios profissionais liberais [3]Gustavo Lopes Courinha, Manual do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas, Almedina, Coimbra, 2019, pág. 59..

Ora, as sociedades de advogados são sociedades de profissionais. Estão sujeitas ao regime da transparência fiscal. Ver o nosso artigo: transparência fiscal – o que é e como evitar.

5) Sociedades de profissionais sujeitas a associações públicas profissionais:

Por sua vez, dentro da categoria das sociedades de profissionais existem ainda as sociedades de profissionais sujeitas a associações públicas profissionais, que são as pessoas coletivas que têm por objeto principal o exercício em comum de atividades profissionais organizadas numa única associação pública profissional (“Ordens” ou “Câmaras”).

Ordem dos Advogados (OA):

É o caso paradigmático das sociedades de advogados, que são sociedades de profissionais sujeitas ao poder disciplinar da Ordem dos Advogados (OA).

Base legal:

– Lei n.º 53/2015, de 11 de junho, que estabelece o regime jurídico da constituição e funcionamento das sociedades de profissionais que estejam sujeitas a associações públicas profissionais [4]Consultar a Lei n.º 53/2015, de 11 de junho no link: https://www.pgdlisboa.pt/leis/lei_mostra_articulado.php?nid=2363&tabela=leis&ficha=1&pagina=1&so_miolo=; e
– o art. 11.º da Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro, que estabelece o regime jurídico de criação, organização e funcionamento das associações públicas profissionais [5]Consultar a Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro no link: https://www.pgdlisboa.pt/leis/lei_mostra_articulado.php?nid=1873&tabela=leis.

6) Regime jurídico das sociedades de Advogados:

6.1) Estatuto da Ordem dos Advogados (EOA):

As sociedades de advogados estão reguladas, desde logo, no Estatuto da Ordem dos Advogados (EOA) constante da Lei n.º 145/2015, de 9 de setembro, com as alterações subsequentes, especialmente nos respetivos artigos 213.º a 222º [6]Consultar o Estatuto da Ordem dos Advogados no link: https://www.pgdlisboa.pt/leis/lei_mostra_articulado.php?nid=2440&tabela=leis&so_miolo=.

6.2) Lei n.º 53/2015, de 11 de junho:

As sociedades de advogados estão também reguladas na Lei n.º 53/2015, de 11 de junho, que estabelece o regime jurídico da constituição e funcionamento das sociedades de profissionais sujeitas a associações públicas profissionais, mas, neste caso, apenas na parte em que não colidir com o Estatuto da Ordem dos Advogados (EOA) (cfr. art. 55.º da Lei n.º 53/2015, de 11 de junho [7]Consultar a Lei n.º 53/2015, de 11 de junho no link: https://www.pgdlisboa.pt/leis/lei_mostra_articulado.php?nid=2363&tabela=leis&ficha=1&pagina=1&so_miolo=).

6.3) Regime específico das transações comerciais:

As sociedades de advogados não são comerciantes (art. 13.º, n.º 2 a contrario do Código Comercial).

Logo, não se lhes aplica o regime jurídico do Código Comercial, salvo quanto aos atos de comércio esporádicos que eventualmente pratiquem como, por exemplo, a assinatura de uma livrança.

Contudo, por serem pessoas coletivas de pleno Direito (têm personalidade jurídica plena) e por realizarem uma atividade económica ou uma atividade profissional autónoma aplica-se-lhes o regime jurídico específico das transações comerciais.

6.4) Responsabilidade limitada (RL) ou responsabilidade ilimitada (RI):

Como já referimos, as sociedades de advogados não podem adotar a forma comercial. As sociedades de advogados só podem optar, no momento da sua constituição, por um de dois tipos, consoante o regime de responsabilidade dos sócios pelas dívidas sociais a adotar, devendo a firma conter a menção ao regime adotado:
a) sociedades de responsabilidade ilimitada, RI;
b) sociedades de responsabilidade limitada, RL (cfr. art. 213.º, n.º 10 do EOA).

Por exemplo, a sociedade de advogados de que somos sócios e administradores – a Pereira Mouta Mendes & Associados, Sociedade de Advogados, SP, RL – é uma sociedade de responsabilidade limitada (RL), o que, como se vê, tem reflexos, desde logo, na respetiva firma ou denominação.

Não temos conhecimento de nenhuma sociedade de Advogados que adote, ou que sequer, alguma vez tenha adotado, o tipo de responsabilidade ilimitada.

6.5) Firma ou denominação – “Sociedade de Advogados, SP, RL”:

A firma das sociedades de profissionais inclui sempre a menção do título profissional dos respetivos sócios profissionais, seguido da expressão «sociedade de profissionais» ou «SP», imediatamente antes da menção da forma jurídica societária que concretamente assuma, e à qual esteja obrigada (art. 20.º, n.º 4 da Lei n.º 53/2015, de 11 de junho).

Por exemplo, a sociedade de advogados de que somos sócios e administradores, no cumprimento desta regra, adota a firma: “Pereira Mouta Mendes & Associados, Sociedade de Advogados, SP, RL”.

A expressão «sociedade de profissionais» ou «SP» é exclusiva das sociedades de profissionais constituídas nos termos da Lei n.º 53/2015, de 11 de junho (art. 20.º, n.º 5 da Lei n.º 53/2015, de 11 de junho).

6.6) Entradas em indústria ou contribuições de indústria:

As sociedades de Advogados, tal como, aliás, todas as sociedades civis sob forma civil, quer aquelas que estão exclusivamente reguladas no Código Civil, quer as que estão abrangidas pelo regime jurídico específico das sociedades de profissionais sujeitas a associações públicas profissionais que adotem a forma civil, admitem que os respetivos sócios realizem entradas de indústria ou contribuições de indústria.

Na verdade, estas últimas sociedades são precisamente aquelas onde as entradas em indústria ou contribuições de indústria têm maior importância prática.

Os sócios cujas participações sociais forem fundadas em entradas de indústria são sócios de indústria.

6.7) Transparência fiscal:

Por serem sociedades de profissionais sujeitas a associações públicas profissionais, as sociedades de Advogados estão necessariamente sujeitas ao regime da transparência fiscal (cfr. art. 6.º, n.º 4 al. a) do Código do IRC [8]Consultar o CIRC no link: https://info.portaldasfinancas.gov.pt/pt/informacao_fiscal/codigos_tributarios/CIRC_2R/Pages/circ-codigo-do-irc-indice.aspx).

Ver, em especial, o nosso artigo: transparência fiscal – o que é e como evitar.