Sociedade anónima (S.A.)

Atualizado em 2023/09/15

1) Definição:

A sociedade anónima (S.A.) é um tipo de sociedade comercial na qual:
– o capital social está dividido em ações (ou melhor, no valor nominal ou de emissão de todas as ações emitidas pela sociedade anónima);
– as ações estão representadas em documentos de papel ou títulos (ações tituladas) ou em registos individualizados em conta (ações escriturais);
– os acionistas (sócios) limitam a sua responsabilidade à sua própria dívida de entrada (não respondem, em princípio, pelas dívidas da sociedade e não são responsáveis perante a sociedade pelo pagamento de todas as entradas convencionadas no pacto social);
– a firma, podendo ter uma composição variada, concluirá, em qualquer caso, pela abreviatura “S.A.” ou pela expressão “sociedade anónima”; e,
– o órgão de administração e representação é o conselho de administração, o administrador único, o conselho de administração executivo ou o administrador executivo único.


2) Estrutura ou técnica jurídica privilegiada para a exploração da grande (e média) empresa:

A sociedade anónima (S.A.) é:
– a estrutura, instrumento, mecanismo ou técnica jurídica(o) privilegiada(o) para a exploração, financiamento, organização e funcionamento da grande empresa moderna; sendo mesmo para alguns Autores:
– «o modelo jurídico de maior complexidade regulatória e até primazia prática para a grande empresa dos nossos dias» [1]J. Engrácia Antunes, Direito das Sociedades Comerciais – Perspetivas do seu ensino, Almedina, Coimbra, 2000, págs. 105 e 107.;
– «a mais perfeita, eficaz e complexa das pessoas coletivas» [2]Yves Guyon apud J. Engrácia Antunes, op. cit., pág. 105.;
– um «instrumento maravilhoso do capitalismo moderno» [3]Georges Ripert apud J. Engrácia Antunes, op. cit., págs. 105 e 42 e apud J. M. Coutinho de Abreu, «Sociedade Anónima – A Sedutora», Miscelândias n.º 1, IDET, Almedina, Coimbra, 2003, … Continuar a ler;
– «a primeira estrela nos palcos mundiais da economia» [4]J. M. Coutinho de Abreu, “Sociedade Anónima – A Sedutora”, Miscelândias n.º 1, IDET, Almedina, Coimbra, 2003, pág. 12..

3) Constituição de sociedades anónimas:

Hoje, os principais meios de constituição de sociedades anónimas e de outros tipos de sociedades comerciais são:
– o processo especial de constituição imediata de sociedades (“empresa na hora”) (ver: constituir empresa na hora);
– o processo especial de constituição online de sociedades (“empresa online”) (ver: constituição de sociedade online); e
– o processo tradicional ou convencional de constituição de sociedades.

Nota: doravante, todas as disposições legais indicadas sem menção expressa da respetiva fonte pertencem ao Código das Sociedades Comerciais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 262/86, de 2 de setembro, com as alterações subsequentes [5]Consultar o Código das Sociedades Comerciais no link: https://www.pgdlisboa.pt/leis/lei_mostra_articulado.php?nid=524&tabela=leis.

Características, vantagens e desvantagens da sociedade anónima:

4) Responsabilidade duplamente (ou mesmo triplamente) limitada por parte dos acionistas:

Nas sociedades anónimas, os sócios (que se desigam “acionistas”) têm uma responsabilidade “duplamente limitada” [6]Pedro Maia, “Tipos de sociedades comerciais”, em Estudos de Direito das Sociedades, coord. de J. M. Coutinho de Abreu, 12ª edição, Almedina, Coimbra, 2015, pág. 19.. Ver: responsabilidade limitada.

4.1) Externamente – os acionistas têm responsabilidade limitada – não respondem perante os credores da sociedade pelas dívidas desta:

Por um lado, externamente, os acionistas têm responsabilidade limitada (limited liability) propriamente dita: via de regra, não respondem perante os credores da sociedade pelas dívidas desta. Pelas dívidas da sociedade responde, em princípio, apenas o património da sociedade (cfr. art. 271.º).

Pelo que, em caso de incumprimento de dívidas por parte da sociedade anónima, os respetivos credores não poderão, em princípio, intentar ações judiciais de cobrança coerciva contra os respetivos acionistas para o pagamento dos valores em falta.

Esta regra da responsabilidade limitada tem, contudo, exceções importantes. Ver: exceções à responsabilidade limitada nas sociedades de responsabilidade limitada.

4.2) Internamente – responsabilidade dos acionistas perante a sociedade:

4.2.1) A responsabilidade de cada acionista é limitada à sua própria entrada – não há responsabilidade pela “integração do capital social”:

Dívida da própria entrada: por outro lado, internamente, os acionistas só respondem perante a sociedade, pela sua própria dívida de entrada (art. 271.º e também, caso se verifiquem os respetivos pressupostos, art. 286.º). Assim, os acionistas não são, nomeadamente, responsáveis perante a sociedade pela integração ou pagamento de todas as entradas convencionadas no pacto social (ao contrário do que ocorre nas sociedades por quotas cfr. arts. 197.º, n.º 1 e 207.º).

Afirma-se, por isso, que os acionistas das sociedades anónimas têm uma responsabilidade “duplamente limitada” [7]Pedro Maia, “Tipos de sociedades comerciais”, em Estudos de Direito das Sociedades, coord. de J. M. Coutinho de Abreu, 12ª edição, Almedina, Coimbra, 2015, pág. 19..

4.2.2) As prestações acessórias são admitidas. E quanto às prestações suplementares?

Prestações acessórias: internamente, perante a sociedade, os acionistas podem, contudo, nos termos estabelecidos no pacto social e dentro dos limites da Lei, ficar vinculados a realizar prestações acessórias (art. 287.º; cfr. também o art. 86.º, n.º 2).

Prestações suplementares? Deve entender-se que as prestações suplementares não são, de forma alguma, admitidas nas sociedades anónimas (ao contrário do que ocorre nas sociedades por quotas cfr. arts. 210.º a 213.º e 197.º, n.º 2).

Assim, considerando este último aspeto, pode afirmar-se que a responsabilidade dos acionistas das sociedades anónimas, especialmente quando confrontada com a responsabilidade dos sócios das sociedades por quotas é até, em certo sentido, “triplamente limitada” (mas já não “tetramente” limitada: admitem-se as prestações acessórias em termos muito semelhantes aos que vigoram para as sociedades por quotas cfr. o art. 287.º com o art. 209.º).

4.3) Conclusão – o único risco para o acionista é perder, total ou parcialmente, o dinheiro/bens diferentes de dinheiro que pagou/entregou ou que se obrigou a pagar para adquirir as respetivas ações e, eventualmente, ficar responsável pelo capital que individualmente subscreveu mas não realizou:

Assim, salvo no caso de ficar obrigado a realizar prestações acessórias, o único risco para cada acionista de uma sociedade anónima é, em princípio, caso esta venha a ser liquidada após dissolução por sentença de declaração de insolvência ou por qualquer outra causa de dissolução, o de:

i) perder (na medida em que não recupera), total ou parcialmente, o dinheiro/bens diferentes de dinheiro que pagou/entregou com a aquisição das respetivas ações:

a) quer essa aquisição tenha sido originária (subscrição de ações), aquando da constituição da sociedade anónima ou do aumento do respetivo capital social, caso em que perde o dinheiro ou bens diferentes de dinheiro objeto, respetivamente, da entrada em dinheiro ou em espécie que já realizou (capital realizado);

b) quer essa aquisição tenha sido derivada (aquisição de ações que já foram previamente emitidas/subscritas), através nomeadamente de uma cessão de ações, concretizada, por exemplo, através de um contrato de compra e venda, caso em que perde o preço que pagou para adquirir as ações; e/ou

ii) eventualmente, caso haja capital subscrito e não realizado ou “capital apenas subscrito” (resultante do diferimento das entradas em dinheiro), ficar responsável (devedor) pelo capital que individualmente tenha subscrito, mas não tenha pago.

Ler mais sobre as «perdas» dos acionistas decorrentes da não distribuição/atribuição de dividendos:

5) Capital social mínimo – regime geral – 50k:

O capital social mínimo nas sociedades anónimas (S.A.) é, em geral, de 50 000€ (art. 276.º, n.º 5).

Porém, em casos especiais, nomeadamente no setor da banca e dos seguros, a Lei pode exigir montantes mais elevados (sobre esta questão e com uma lista exaustiva de todos os regimes especiais ver o nosso artigo: capital social mínimo).

Sobre o capital social em geral, concretamente, a respetiva definição, âmbito, computação ou contabilização, possibilidade de utilização, inscrição contabilística, entre outros aspetos, ver o nosso artigo: capital social.

6) Número mínimo de sócios – 5; exceção: sociedade anónima unipessoal – 1:

A sociedade anónima só pode ser constituída:

a) por um número de acionistas igual ou superior a cinco (arts. 273.º, n.º 1 e 7.º, n.º 2). Nesse caso, se posteriormente, isto é, depois de estar constituída, a sociedade anónima estiver, durante mais de 12 meses, com um número de acionistas inferior a cinco, fica sujeita a dissolução administrativa (arts. 464.º, n.º 3 e 142.º, n.º 1 al. a)); ou

b) por um único sócio (sociedade anónima unipessoal) se esse sócio único for:
– uma outra sociedade anónima,
– uma sociedade por quotas,
– uma sociedade unipessoal por quotas, ou ainda
– uma sociedade em comandita por ações (arts. 481.º, n.º 1, 488.º e 270.º-G).

7) Participações sociais – ações:

7.1) Definição de ação ou ações:

A palavra “ação” ou, no plural, “ações” exprime um conceito unitário; contudo, esse conceito pode ser encarado de várias perspetivas. Com efeito, como observa Alexandre Soveral Martins «mais do que realidades diferentes, estamos perante várias faces da mesma realidade» [10]A. Soveral Martins, Cláusulas do Contrato de Sociedade que Limitam a Transmissibilidade das Ações, Almedina, Coimbra, 2006, pág. 75..

Assim, as ações são:

– a participação social do acionista numa sociedade anónima (pode afirmar-se que a participação social é o «conjunto unitário de direitos e deveres atuais e potenciais do sócio [enquanto tal])» [11]J. M. Coutinho de Abreu, Curso De Direito Comercial – Das Sociedades, Volume II, 7ª edição, Almedina, Coimbra, 2021, págs. 73 e 205.;
– uma fração do capital social da sociedade anónima, uma vez que a Lei afirma que o capital social das sociedades anónimas está “dividido em ações” (art. 271.º) (porém, rigorosamente o capital social está dividido não nas ações, mas sim nos valores nominais ou de emissão de todas as ações emitidas pela sociedade);
– a forma de representação da participação social (ação), quer se trate, no caso das ações tituladas, do documento de papel ou título (representação cartular), quer se trate, no caso das ações escriturais, do registo individualizado em conta realizado em suporte informático (representação escritural) (art. 274.º do CSC e art. 46.º do Código dos Valores Mobiliários [CVM] [12]Consultar o Código dos Valores Mobiliários no link: https://www.pgdlisboa.pt/leis/lei_mostra_articulado.php?nid=450&tabela=leis); mas também

– um valor mobiliário (cfr. art. 1.º, n.º 1 al. a) do CVM);
– de forma mais ampla, um instrumento financeiro (de natureza mobiliária) (cfr. art. 2.º, n.ºs 2 e 1 al. a) do CVM); e ainda,
– se se tratar de uma ação emitida por uma sociedade anónima “cotada em bolsa” (rigorosamente, sociedade anónima emitente de ações admitidas à negociação em mercado regulamentado), um produto financeiro [13]Sobre a ação enquanto valor mobiliário, instrumento financeiro (de natureza mobiliária) e produto financeiro vide J. Engrácia Antunes, Os Instrumentos Financeiros, 4ª edição, Almedina, … Continuar a ler.

7.2) Várias “ações” ou apenas uma “ação”:

Via de regra, cada acionista é titular de várias ações; mais excecionalmente, é titular de apenas uma ação.

7.3) Ações com valor nominal vs ações sem valor nominal:

As ações de uma sociedade anónima podem ser ações com valor nominal ou ações sem valor nominal. Porém, na mesma sociedade anónima não podem coexistir ações com valor nominal e ações sem valor nominal:
– ou todas as ações emitidas pela sociedade são ações com valor nominal;
– ou todas as ações emitidas pela sociedade são ações sem valor nominal (art. 276.º, nºs 1 e 2).

Via de regra, as sociedades anónimas optam por ter ações com valor nominal.

7.4) Todas as ações representam a mesma fração no capital social:

Todas as ações emitidas pela sociedade anónima devem representar a mesma fração no capital social. Se forem ações com valor nominal, todas as ações da sociedade devem ter o mesmo valor nominal (art. 276.º, n.º 4).

7.5) Ações com valor nominal – as ações têm um determinado valor nominal, que determina o peso relativo do acionista no capital social:

As ações têm um determinado valor nominal (par value, no mind value [14]Ana Perestrelo de Oliveira, Manual de Corporate Finance, 2ª edição, Almedina, Coimbra, 2015, pág. 60.), que:
– deve ser igual para todas as ações; e que,
– não pode ser inferior a 1 cêntimo (0,01€) (art. 276.º, n.ºs 3 e 4).

A soma dos valores nominais de todas as ações corresponde à cifra do capital social. Por exemplo, uma sociedade anónima com um capital social de 50 000€ e cujas ações tenham um valor nominal de 0,50€ (50 cêntimos) terá um total de 100 000 (cem mil) ações emitidas.

Ora, a proporção dos valores nominais de todas as ações de um acionista no capital social da sociedade determina o peso relativo desse acionista no capital social. Por exemplo, na sociedade anónima acima referida, se há um acionista dessa sociedade que tem 51 000 ações, no valor nominal global de 25 500€, esse acionista será titular de ações correspondentes a 51% do capital social dessa sociedade.

7.6) O peso relativo do acionista no capital social determina a medida, maior ou menor, dos seus direitos e deveres, em especial, lucros/perdas e voto:

A proporção dos valores nominais de todas as ações de cada acionista no capital social da sociedade anónima determina, em princípio, a medida, maior ou menor, dos seus direitos e obrigações.

7.6.1) Direito ao lucro e dever de quinhoar nas perdas:

Em regra, os acionistas participam nos lucros e nas perdas da sociedade de acordo com a proporção dos valores nominais das respetivas ações no capital social da sociedade (art. 22.º, n.º 1).

7.6.2) Direito ao voto em assembleia geral regularmente convocada ou através de qualquer outra forma de deliberação social:

Salvo cláusula no pacto social (estatutos ou contrato de sociedade) em sentido diverso, a cada ação corresponde um voto (one share, one vote) (art. 384.º, n.º 1). Admitem-se, contudo, vários desvios esta regra.

Ver desvios à regra one share , one vote

7.6.3) Controlo ou domínio da sociedade:

O acionista tem o domínio ou o controlo de uma sociedade anónima quando:
a) detém uma participação maioritária no capital;
b) dispõe de mais de metade dos votos; ou
c) tem a possibilidade de designar mais de metade dos membros do órgão de administração ou do órgão de fiscalização (cfr. arts. 486.º, n.º 2; cfr. também, arts. 386.º, n.º 2 e 403.º).

7.7) Transmissão de ações; cessão de ações:

As ações podem ser transmitidas a outros sujeitos, acionistas ou não-acionistas da sociedade. A transmissão entre vivos por ato voluntário designa-se cessão de ações, a qual pode operar através de: contrato de compra e venda, contrato de doação, dação em cumprimento, contrato de troca ou permuta, entrada em sociedade (entrada em espécie), etc…

8) Órgãos sociais – estrutura orgânica:

8.1) Estruturas ou modelos de administração e fiscalização; 3 ou 4?:

A sociedade deve optar por uma de entre quatro estruturas ou modelos de estruturação orgânica (ou modelos de administração e fiscalização) (a Lei refere que pode ser escolhida “uma de três modalidades”; no entanto, uma dessas “modalidades” desdobra-se, na realidade, em duas):

i) o modelo latino, clássico ou monista simples (que é o modelo mais usado pelas sociedades anónimas em Portugal);
ii) o modelo latino, clássico ou monista reforçado (que é obrigatório para as sociedades anónimas de grandes dimensões e para as sociedades anónimas emitentes de valores mobiliários admitidos à negociação em mercado regulamentado que queiram adotar o modelo latino [ver em baixo ponto 11.2], sendo meramente facultativo para as restantes);
iii) o modelo anglo-saxónico; ou
iv) o modelo germânico ou dualista (cfr. arts. 272.º al. g) e 278.º, 413.º, nºs 1 e 2) [15]Sobre esta matéria, vide, por todos, Paulo Câmara, “Os Modelos de Governo das Sociedades Anónimas”, AAVV, Reformas do Código das Sociedades, Colóquios do IDET n.º 3, Almedina, … Continuar a ler.

8.1.1) Modelo latino simples:

O modelo latino, clássico ou monista simples é composto:
– por um conselho de administração ou por um administrador único, como órgão de administração e representação; e
– por um conselho fiscal ou por um fiscal único, como órgão de fiscalização.

8.2) Slides / diapositivos relativos aos quatro modelos de estruturação orgânica (ou modelos de administração e fiscalização) das sociedades anónimas:





No sentido de que a comissão de auditoria é um “subórgão do conselho de administração”, Ricardo Costa, Código das Sociedades Comerciais em Comentário, Volume VI, coord. de J. M. Coutinho de Abreu, 2ª edição, Almedina, Coimbra, 2019, págs. 702 a 704. Cfr. também os arts. 278.º, n.º 1 al. b) e 423.º-B, n.º 1. Neste sentido, vide ainda o seguinte excerto do preâmbulo do Decreto-Lei n.º 76-A/2006, de 29 de março, que procedeu a uma reforma profunda no CSC (e noutros diplomas legais), tendo nomeadamente introduzido neste, quanto às S.A., o chamado «modelo anglo-saxónico»: passa a existir «um terceiro modelo de organização, típico das sociedades anglo-saxónicas, que compreende a existência obrigatória de uma comissão de auditoria dentro do órgão de administração».



– a) Órgão deliberativo interno (Assembleia Geral) – laranja/castanho; b) órgãos de administração e representação – amarelo; c) órgãos de fiscalização – verde.
– Sobre esta matéria, vide, por todos, Paulo Câmara, ” Os Modelos de Governo das Sociedades Anónimas”, em AAVV, Reformas do Código das Sociedades, Colóquios do IDET n.º 3, Almedina, Coimbra, 2007, págs. 179 a 242; em AAVV, Jornadas em Homenagem ao Professor Raúl Ventura, A Reforma do Código das Sociedades Comerciais, Almedina, Coimbra, 2007, págs. 197 a 258; e em “O Governo das Sociedades e a Reforma do Código das Sociedades Comerciais”, AAVV, Código das Sociedades Comerciais e Governo das Sociedades, coord. de Paulo Câmara, Almedina, Coimbra, 2008, págs. 66 a 133.

8.3) Órgãos:

I) Assembleia Geral – órgão deliberativo-interno:

A Assembleia geral, coletividade de sócios, conjunto dos sócios ou assembleia de sócios é o órgão deliberativo-interno comum a todos os tipos de sociedade comercial e a todas as estruturas ou modelos de administração e fiscalização das sociedades anónimas, sendo tradicionalmente considerado o “órgão supremo da sociedade” [16]Pedro Maia, “Deliberações dos sócios”, em Estudos de Direito das Sociedades, coord. de J. M. Coutinho de Abreu, 12ª edição, Almedina, 2015, págs. 270 e 271 e Ricardo Costa, Código das … Continuar a ler.

A “Assembleia geral” também designa a reunião dos acionistas (presença no mesmo local e ao mesmo tempo) para deliberar sobre determinados assuntos, que pode ser uma assembleia geral regularmente convocada ou uma assembleia universal.

Para além destas duas formas de deliberação existem ainda, na sociedade anónima, as deliberações unânimes por escrito (arts. 373.º, n.º 1 e 54.º).

Presidente e secretário da mesa da Assembleia Geral – a Lei estabelece a obrigatoriedade de existência de uma mesa da assembleia geral, com caráter permanente, composta, pelo menos, por:
– um presidente da mesa da assembleia geral (deve considerar-se que é um órgão da sociedade, porquanto a Lei confere-lhe competências próprias [17]Neste sentido, Pedro Maia, op. cit., pág. 27.); e,
– um secretário da mesa da assembleia geral (art. 374.º).

II) Órgão de administração e representação:

O órgão de administração e representação nas sociedades anónimas (S.A.) é:
a) o conselho de administração (que é composto pelos administradores),
b) o administrador único,
c) o conselho de administração executivo (que é composto pelos administradores) ou
d) o administrador executivo único.

Base legal:
– quanto aos órgãos sociais ou estrutura orgânica, cfr. os arts. 278.º, nºs 1, 2 e 5, 390.º, nºs 1 e 2, 424.º;
– quanto às competências para administrar e representar a sociedade, cfr. os arts. 373.º, n.ºs 2 e 3, 405.º e 406.º.

III) Órgão(s) de fiscalização:

A sociedade anónima (S.A.) tem que ter sempre, pelo menos, um órgão de fiscalização. Assim, consoante o modelo de administração e fiscalização que adotar, a sociedade anónima (S.A.) terá:
a) um conselho fiscal ou um fiscal único;
b) um conselho fiscal e um revisor oficial de contas autónomo (que não seja membro daquele órgão);
c) uma comissão de auditoria e um revisor oficial de contas autónomo (que não seja membro daquele órgão); ou
d) um conselho geral e de supervisão e um revisor oficial de contas autónomo (que não seja membro daquele órgão) (arts. 272.º al. g), 278.º, 413.º, 414.º a 423.º-H e 434.º a 446.º).

9) Firma:

9.1) Formação inicial:

A firma das sociedades anónimas deve ser formada, com ou sem sigla:
– pelo nome ou firma de todos, algum ou alguns dos sócios (firma-nome);
– por uma denominação particular (firma-denominação);
– pela reunião de ambos esses elementos (firma-mista); ou ainda,
– por uma firma de fantasia, pura ou impura (por ex. “The Navigator Company, S.A.).

Sobre todos estes tipos de firma e sobre a firma em geral ver o nosso artigo: firma.

9.2) Formação complementar – “S. A.”, “S.A.”, “SA” ou “sociedade anónima”:

A Lei determina que, em qualquer dos casos, a firma deverá concluir pela abreviatura «S. A.» (S maiúsculo, ponto, espaço, A maiúsculo e ponto) ou pela expressão «sociedade anónima» (cfr. art. 275.º, n.º 1, que, nesta parte, ainda tem a redação originária de 1986).

Ler mais sobre a questão de saber se se deve escrever «S. A.», «S.A.» ou «SA»


Interpretando de forma atualista a regra do art. 275.º, n.º 1, deve entender-se que a firma da sociedade anónima:
a) tanto pode concluir com a abreviatura ou sigla «S.A.» ou
b) com a abreviatura ou sigla «SA» (em qualquer dos casos, com exclusão do espaço).

Da nossa parte, por corresponder à prática registal dominante, optamos, por enquanto, por empregar a sigla ou abreviatura «S.A.».

Por exemplo: “EDP – Energias de Portugal, S.A.”; “Galp Energia, S.A.”.

10) Adequada a explorar médias e grandes empresas; custos e complexidade elevados (“desvantagens”):

A sociedade anónima é um tipo legal mais pensado para a exploração de médias e grandes empresas. Ver: tipos de sociedades comerciais.

Com efeito:
– tem uma estrutura orgânica pesada (bem mais pesada do que a que é exigida para a sociedade por quotas);
– tem um número mínimo de cinco acionistas (ou de apenas um, consoante o caso);
– tem um capital social mínimo de 50 000€;
– tem um regime regra de livre transmissibilidade de ações; entre outros fatores.

11) Categorias (“sub-tipos”) de sociedades anónimas:

Quanto ao regime jurídico aplicável dentro das sociedades anónimas importa distinguir entre:

11.1) Grandes vs pequenas:

a) as grandes sociedades anónimas [18]Com esta terminologia ou nomenclatura, Paulo Olavo Cunha, Direito das Sociedades Comerciais, 7ª edição, Almedina, Coimbra, 2019, págs. 99 a 101. ou sociedades anónimas de grande dimensão, que são aquelas que tenham atingido:
          i) Total do balanço: 20 000 000€,
          ii) Volume de negócios líquido: 40 000 000€,
          iii) Número médio de empregados durante o período: 250 (cfr. por exemplo. art. 413.º, n.º 2 al. a)); e

b) as pequenas sociedades anónimas, que são todas as sociedades anónimas que não forem qualificadas como grandes.

11.2) a) fechadas (não cotadas) vs b) cotadas (emitentes de ações admitidas à negociação em mercado regulamentado):

a) Sociedades anónimas fechadas (não cotadas – privately held company ou private company):

As sociedades anónimas fechadas (ou não cotadas) – que são todas as sociedades anónimas que não são emitentes de ações admitidas à negociação em mercado regulamentado situado ou a funcionar em Portugal. Podem corresponder a grandes sociedades anónimas ou a pequenas sociedades anónimas (ver subponto anterior – 11.1). A esmagadora maioria das sociedades anónimas Portuguesas são fechadas (private).

Estas, por sua vez, podem ser:

a-a) sociedades anónimas (fechadas) que não são emitentes de qualquer espécie de valores mobiliários em mercado regulamentado, ou seja, que:
i) não são emitentes de ações admitidas à negociação em mercado regulamentado situado ou a funcionar em Portugal,
ii) nem são emitentes de qualquer outra espécie de valores mobiliários em mercado regulamentado situado ou a funcionar em Portugal (correspondem à grande maioria das sociedades anónimas Portuguesas); ou

a-b) sociedades anónimas (fechadas) que
– portanto, não são emitentes de ações admitidas à negociação em mercado regulamentado situado ou a funcionar em Portugal,
– mas são emitentes de, pelo menos, uma outra espécie de valores mobiliários admitidos à negociação em mercado regulamentado. É o caso paradigmático das sociedades anónimas que emitem obrigações, mas que não são cotadas “em bolsa”. É o que acontece, por exemplo, com o grupo português Agris, (“In Agris, SGPS, S.A.”) dona da Agriloja [19]«O grupo Agris, dono da rede de lojas Agriloja, estreou-se na Euronext Lisboa através de uma emissão de obrigações no montante de 15 milhões de euros» – link: … Continuar a ler). Cfr. o art. 1.º do Código dos Valores Mobiliários que estabelece um elenco não taxativo de valores mobiliários [20]Consultar o Código dos Valores Mobiliários no link: https://www.pgdlisboa.pt/leis/lei_mostra_articulado.php?nid=450&tabela=leis.

b) Sociedades anónimas cotadas (emitentes de ações admitidas à negociação em mercado regulamentado – public company, publicly traded company ou publicly held company):

As sociedades anónimas cotadas que são as sociedades anónimas emitentes de ações (que, como vimos em cima, são valores mobiliários) admitidas à negociação em mercado regulamentado (ou em sistema de negociação multilateral) situado ou a funcionar em Portugal [21]José Ferreira Gomes e Diogo Costa Gonçalves, Manual de sociedades abertas e de sociedades cotadas, Volume I, AAFDL Editora, Lisboa, 2018, pág. 31..

Correspondem, na prática, em Portugal, a grandes sociedades anónimas (cfr. por exemplo, o art. 444.º, nºs 2 e 6 que distingue entre esta categoria de sociedades e as sociedades anónimas emitentes de valores mobiliários em geral.

Nota – eliminação das “sociedades abertas”:

A Lei n.º 99-A/2021, de 31 de dezembro, que alterou o Código dos Valores Mobiliários, eliminou a figura da sociedade aberta – que, antes, podia ser cotada ou não cotada.

12) Número de sociedades anónimas em Portugal:

Em 2021, estavam inscritas ou registadas no Ficheiro Central de Pessoas Coletivas (FCPC) 30 985 sociedades anónimas não extintas [22]Dados obtidos em https://estatisticas.justica.gov.pt/sites/siej/pt-pt/Paginas/Entidades_inscritas_FCPC.aspx.

Por outro lado, segundo dados do INE, as sociedades anónimas registaram em 2020:
– um volume de negócios de 190 013 574€ (aproximadamente 90 mil milhões de Euros); e
– um número de trabalhadores de 1 067 778 (aproximadamente 1 milhão de pessoas) [23]Relatório do Instituto Nacional de Estatística. Consultar no link: https://www.ine.pt/ngt_server/attachfileu.jsp?look_parentBoui=553327500&att_display=n&att_download=y.