
1) Definição:
Em face da Lei Portuguesa, consórcio é o contrato pelo qual duas ou mais pessoas, singulares ou coletivas, que exercem uma atividade económica se obrigam entre si, de forma concertada, a realizar certa atividade ou efetuar certa contribuição com o fim de:
a) realizar atos, materiais ou jurídicos, preparatórios quer de um determinado empreendimento, quer de uma atividade contínua;
b) executar um determinado empreendimento;
c) fornecer a terceiros bens, iguais ou complementares entre si, produzidos por cada um dos membros do consórcio;
d) pesquisar ou explorar recursos naturais;
e) produzir bens que possam ser repartidos, em espécie, entre os membros do consórcio (arts. 1.º e 2.º do Decreto-Lei n.º 231/81, de 28 de julho, que estabelece o regime jurídico dos contratos de consórcio e de associação em participação, ainda sem alterações [1]Consultar o Decreto-Lei n.º 231/81, de 28 de julho no link: https://www.pgdlisboa.pt/leis/lei_mostra_articulado.php?nid=705&tabela=leis).
Índice
- 1) Definição:
- 2) Regulação:
- 3) Consórcio interno vs consórcio externo:
- 4) Denominação do consórcio externo:
- 5) Exemplos concretos de consórcios:
- 6) O consórcio não tem personalidade jurídica – unincorporated joint venture:
- 7) Consórcio vs ACE:
- 8) Elementos essenciais do consórcio:
- 9) Outras características do consórcio:
- 10) Estrutura “orgânica” do consórcio externo:
- 11) Contrato de cooperação ou colaboração empresarial:
2) Regulação:
Em Portugal, o contrato de consórcio está regulado nos arts. 1.º a 20.º do Decreto-Lei n.º 231/81, de 28 de julho, que estabelece o regime jurídico dos contratos de consórcio e de associação em participação [2]Consultar o Decreto-Lei n.º 231/81, de 28 de julho no link: https://www.pgdlisboa.pt/leis/lei_mostra_articulado.php?nid=705&tabela=leis.
Nota: doravante, todas as disposições legais indicadas sem menção expressa da respetiva fonte reportam-se a este diploma legal.
3) Consórcio interno vs consórcio externo:
Contrato de consórcio interno – quando:
a) as atividades ou os bens são fornecidos pelos vários membros do consórcio a apenas um deles e só este (designado, por vezes, chefe de consórcio evidente) estabelece relações com terceiros, sem, contudo, jamais invocar essa qualidade (de membro de um consórcio); ou
b) as atividades ou os bens são fornecidos diretamente a terceiros por todos e cada um dos membros do consórcio, sem expressa invocação perante aqueles dessa qualidade (de membro de um consórcio) [3]J. Engrácia Antunes, Direito das Sociedades, 10ª edição, Edição de Autor, Porto, 2021, págs. 129 e 130..
Contrato de consórcio externo – quando as atividades ou os bens são fornecidos diretamente a terceiros por cada um dos membros do consórcio, com expressa invocação dessa qualidade (art. 5.º).
Diferença entre ambos:
– no consórcio interno, os membros não indicam nas relações com terceiros que atuam na qualidade de membros de um consórcio; ao passo que,
– no consórcio externo, os membros do consórcio indicam expressamente nas relações com terceiros que atuam na qualidade de membros de um consórcio.
4) Denominação do consórcio externo:
Os membros do consórcio externo podem fazer-se designar coletivamente, juntando todos os seus nomes, firmas ou denominações sociais, com o aditamento ‘Consórcio de …’ ou, ‘… em consórcio’ (art. 15.º).
5) Exemplos concretos de consórcios:
Para obras públicas:
É muito frequente a celebração de contratos de consórcio para realizar candidaturas a concursos de obras públicas.
Por exemplo: “O consórcio formado por Mota-Engil e a Teixeira Duarte, as duas maiores construtoras nacionais, levou a melhor sobre outras oito propostas, incluindo de empresas espanholas, para a construção do corredor ferroviário internacional sul, entre Évora e a fronteira, ao apresentar a proposta mais competitiva economicamente, num total de cerca de 87 milhões de euros” [4]https://eco.sapo.pt/2021/02/23/mota-engil-e-teixeira-duarte-vencem-primeira-obra-juntas/.
Para imobiliário e construção civil em geral:
Consórcio para empreendimento imobiliário entre a Consest-Promoção Imobiliária, S.A., detida pela Parpública (Estado Português), e a Cottees – Compra e Venda De Imóveis, Lda. (Vasco Pereira Coutinho) para a construção de um empreendimento imobiliário na Quinta da Falagueira, no concelho da Amadora. A Cottees, Lda detida por Vasco Pereira Coutinho reclamou o pagamento de 148 milhões de Euros de indemnização [5]https://expresso.pt/economia/2020-05-01-Supremo-admite-recurso-de-Pereira-Coutinho-em-diferendo-milionario-com-o-Estado.
Para produzir vacinas contra a Covid-19:
O consórcio entre a Pfizer (Norte-americana) e a BioNtech (Alemã) [6]https://www.publico.pt/2021/02/17/ciencia/noticia/ue-compra-200-milhoes-doses-vacina-pfizerbiontech-150-milhoes-moderna-1950986 para a realização, desenvolvimento e produção de uma vacina destinada a fornecer imunidade, pelo menos, parcial contra a doença Covid-19.
6) O consórcio não tem personalidade jurídica – unincorporated joint venture:
Em face da Lei Portuguesa, o consórcio, interno ou externo, não tem personalidade jurídica, ou seja, não é uma pessoa coletiva.
Com efeito, o contrato de consórcio (ao contrário do que ocorre com o contrato de sociedade comercial ou de sociedade civil sob forma comercial devidamente registado), em qualquer das suas modalidades, não dá origem a um novo sujeito de Direito distinto e autónomo face aos sujeitos dos respetivos membros.
O consórcio é uma modalidade de contrato de joint venture que tem uma base puramente contratual, isto é, que não dá origem a uma nova entidade. Corresponde àquilo a que no Direito Inglês e Norte-Americano se designa unincorporated joint venture.
7) Consórcio vs ACE:
A principal diferença entre o consórcio e o agrupamento complementar de empresas (ACE) é a de que:
– o consórcio não tem personalidade jurídica: não é uma entidade autónoma face aos sujeitos de Direito, pessoas singulares ou coletivas, que o criaram; ao passo que,
– o agrupamento complementar de empresas (ACE) goza de personalidade jurídica – é uma pessoa coletiva, distinta e autónoma face aos sujeitos dos respetivos membros [“agrupados” ou “sócios”], com aptidão para ser titular, em nome próprio, de direitos e obrigações). Está sujeita a registo comercial e deve ser inscrita no Registo Nacional de Pessoas Coletivas.
8) Elementos essenciais do consórcio:
i) Duas ou mais partes, pessoas singulares ou pessoas coletivas, que exercem uma atividade económica;
ii) Atuação concertada e concatenada entre as partes – há uma organização comum;
iii) Atuação concertada entre as partes que visa a realização de uma certa atividade ou a efetivação de uma certa contribuição;
iv) Objetivo comum dos consorciados [7]A. Menezes Cordeiro, colab. A. Barreto Menezes Cordeiro, Direito Comercial, 5ª edição, Almedina, Coimbra, 2022, págs. 753 a 754. de:
a) realizar atos, materiais ou jurídicos, preparatórios quer de um determinado empreendimento, quer de uma atividade contínua;
b) executar um determinado empreendimento;
c) fornecer a terceiros bens, iguais ou complementares entre si, produzidos por cada um dos membros do consórcio;
d) pesquisar ou explorar recursos naturais;
e) produzir bens que possam ser repartidos, em espécie, entre os membros do consórcio (arts. 1.º e 2.º).
v) Elemento formal – forma escrita ou ainda mais solene – o contrato de consórcio está sujeito a forma escrita (documento particular); porém, se entre os membros do consórcio houver transmissão de bens imóveis, exige-se que o contrato seja celebrado por documento particular autenticado ou escritura pública (art. 3.º do Dec-Lei n.º 231/81, de 28 de julho e art. 875.º do Código Civil [8]Consultar o Código Civil no link: https://www.pgdlisboa.pt/leis/lei_mostra_articulado.php?nid=775&tabela=leis).
9) Outras características do consórcio:
Não está sujeito a registo – o contrato de consórcio não está sujeito a registo comercial.
Proibição de fundos comuns – não é permitida a constituição de fundos comuns em qualquer consórcio (art. 20.º).
10) Estrutura “orgânica” do consórcio externo:
i) Chefe do consórcio – é obrigatório: deve ser designado no contrato (art. 12.º).
ii) Conselho de orientação e fiscalização – é meramente eventual: só existe se for expressamente estabelecido no contrato de consórcio externo (art. 7.º).
11) Contrato de cooperação ou colaboração empresarial:
O contrato de consórcio deriva da figura dos “joint ventures” do Direito anglo-saxónico [9]A. Menezes Cordeiro, colab. A. Barreto Menezes Cordeiro, op. cit., pág. 749..
Em face da Lei Portuguesa, o contrato de consórcio integra a categoria dos contratos de cooperação ou colaboração empresarial [10]J. Engrácia Antunes, Direito dos Contratos Comerciais, Almedina, Coimbra, 2009, págs. 389 a 392; ver ainda págs. 398 a 405. ou contratos de organização [11]A. Menezes Cordeiro, colab. A. Barreto Menezes Cordeiro, op. cit., págs. 734 e 753.. Nestes contratos, as partes não têm interesses contrapostos; têm interesses comuns.